Indisciplina na Escola: problema de quem?

Folha de São Paulo, Equilíbrio, p. 6

Silvia M. Gasparian Colello
Professora de Psicologia da Educação da Faculdade de Educação da USP


A indisciplina nas escolas brasileiras é um fato. Alastrando-se em diferentes instituições e segmentos do ensino, a falta de limites, o desrespeito e as ocorrências de violência e vandalismo são queixas que se multiplicam entre pais, professores e gestores. Mas, afinal, de quem é o problema e como lidar com ele?

Quando a indisciplina é encarada como um monólito, isto é, como um bloco de ocorrências uniforme e incompreensível, resta apenas o perverso jogo de culpabilização: as escolas criticam os pais “que não educam os filhos”; os professores incriminam os alunos “carentes e desequilibrados” e as famílias culpam o “ensino de baixa qualidade”; muitos apontam para a “a crise de valores, um mal do nosso tempo”.

Nestes casos, pouco pode ser feito, exceto defender-se das acusações, conformar-se com o “inevitável” e remediar a situação em âmbitos específicos: o professor tenta controlar a classe, o aluno suporta o bulliyng dos colegas, os pais repreendem o filho rebelde. Cada um deles lidando solitariamente com a situação, como se o problema fosse pessoal. Pior que isso, nem sempre sabem o que fazer.

Se, por outro lado, a indisciplina fosse compreendida na sua complexidade, entendendo-se, em cada caso, a conjugação de fatores sociais, institucionais, pedagógicos, afetivos e relacionais, o desafio poderia ser enfrentado na parceria responsável entre famílias, escolas e poder público. Um enfrentamento capaz de lidar com a gênese do problema (e não só com seus efeitos), articulando o projeto educativo à formação ética dos alunos. Assim, a indisciplina deixaria de ser um requisito para a eficiência escolar, passando à condição de meta do projeto pedagógico, tão legítima quanto ensinar conteúdos.

Enfrentar a indisciplina requer medidas conjugadas em diferentes planos de intervenção. Na esfera sociopolítica, cabe o investimento na valorização da vida, do trabalho, da educação e da escola. No que tange a cultura, importa promover a democratização dos bens culturais, fomentando iniciativas de lazer, esporte e inserção social da juventude. No âmbito escolar, é preciso não só cuidar da formação dos professores, como também fortalecer o projeto pedagógico a partir de sólidas diretrizes para a formação humana. A cooperação entre pais e educadores é, igualmente, indispensável para a reconfiguração da vida estudantil, pois a negociação de metas e linhas de conduta favorece a educação em valores e a conquista da postura crítica entre os alunos.

Sob esta ótica, talvez, a questão possa ser respondida de modo mais efetivo: a indisciplina na escola é um problema de todos nós.