Dia Mundial da Alfabetização reforça importância da temática em meio as consequências da pandemia

Fundação Abrinq, Notícias

No dia 08 de setembro, comemora-se o Dia Mundial da Alfabetização. A data foi criada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 1966.

Essa celebração foi instituída com o objetivo de que assuntos e questões ligados à alfabetização fossem discutidos no mundo todo, promovendo o amplo debate sobre a importância da alfabetização, principalmente em países que ainda possuem índice de analfabetismo considerável.

A alfabetização de crianças e adultos pode mudar de maneira significativa os rumos de um país, uma vez que, quanto maior o acesso do indivíduo a tudo o que a leitura oferece, seja por via cultural, lazer ou até mesmo pela própria educação, maiores são as chances de conquistar melhores oportunidades no mercado de trabalho e, consequentemente, uma melhor qualidade de vida e acesso a novos caminhos.

Assim sendo, esta data tem uma relevância muito grande, já que não só conscientiza sobre a importância de saber ler e escrever, como também discute e propõe alternativas possíveis para que a alfabetização seja acessível a todos.

Analfabetismo em números

Os esforços para erradicar o analfabetismo no mundo têm sido constantes. De acordo com dados divulgados pela Unesco, em 2019, apesar dos progressos feitos ao longo dos anos, cerca de 773 milhões de adultos em todo o mundo ainda não dominam as competências básicas em escrita e leitura.

No Brasil, as taxas de analfabetismo têm diminuído nos últimos anos, mas ainda estão longe de serem ideais. O país ainda tem 11 milhões de analfabetos, segundo dados de 2019 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Na faixa entre 15 anos ou mais, a taxa de analfabetismo passou de 7,3% (2016) para 6,6% (2019). Segundo o levantamento, o analfabetismo no Brasil está diretamente ligado à idade. Isso quer dizer que quanto mais velho o grupo populacional, maior a proporção de analfabetos.

A importância da alfabetização: mais que ler e escrever

A etapa mais importante do desenvolvimento infantil se inicia na primeira infância. Nesta fase, a aprendizagem acontece inicialmente por meio das brincadeiras, musicalidade, artes e tantas outras atividades que despertam a curiosidade das crianças.

A alfabetização é definida como o processo de aprendizagem onde se desenvolve a habilidade de ler e escrever de maneira adequada e a utilizá-la como um código de comunicação com o meio.

A professora e pesquisadora da pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Silvia Colello comenta sobre o processo de alfabetização, a sua importância e os desafios neste período de pandemia. A especialista é autora de seis livros, incluindo, Alfabetização: O quê, Por quê e Como (2021) e A escola que (não) ensina a escrever (2004).

Qual o significado deste Dia Mundial da Alfabetização?

A data foi criada para que seja um marco no processo de alfabetização. Ela [a alfabetização] é importante em três sentidos:

Pessoal – A língua escrita é constitutiva do indivíduo. Aquele que tem o recurso de ler e escrever, adquire consequentemente, uma série de estratégias e modos de comportamento. Sabe buscar uma informação ou transmitir uma ideia.

Pedagógico – A data nos faz refletir sobre a qualidade de ensino. No mundo de hoje, não vale mais a pena somente aprender a ler e escrever no sentido restrito de dominar a ortografia. É preciso qualificá-lo para promover a emancipação da pessoa.

Político – Não há democracia se não existir uma sociedade letrada, indivíduos que possam transitar nas práticas de língua escrita do seu mundo.

Há uma idade indicada para iniciar a alfabetização da criança?

Desde que nasce, a criança já tem contato com situações nas quais o letramento está presente, seja pelo contato com a literatura infantil, seja pelas brincadeiras cantadas, trabalho com rimas e a consciência de palavras está bastante presente.

Os desafios aos educadores são vários, pois cada criança é um sujeito único, um ser singular, que participa de práticas de letramento diferenciadas, de acordo com o seu repertório cultural, adquirido na família e no ambiente social em que vive.

Emília Ferreiro, pesquisadora argentina, diz que a criança não pede autorização para aprender. Ela [a criança] é um ser curioso e se apropria das práticas do seu mundo. Um exemplo: uma mãe que conta histórias para seu filho. Este, irá se apropriando da ideia de gênero, ou seja, um conto de fadas é diferente de uma notícia de jornal, ou de uma receita de cozinha, e a maneira como são escritas, são diferentes da maneira com que a gente fala. Este aprendizado é a chave para poder se alfabetizar.

A criança que convive com as práticas de leitura e escrita desde muito cedo, quando chega à escola, manifesta o desejo de aprender a ler e escrever e este aprendizado, consequentemente, acontece de forma rápida e natural. Já aquelas que convivem em ambientes menos letrados e não têm contato com gibis e livros em casa, acabam por levar mais tempo neste processo de aprendizagem ou, às vezes, não conseguem aprender a ler e escrever.

Como incentivar este processo de forma natural?

O ideal é termos políticas públicas de distribuição, não só de livros, gibis e materiais escritos, mas também no sentido de promoção do acesso aos bens culturais (cinema, teatro, exposição), estimulo às campanhas de orientação aos pais de incentivo à leitura infantil e disponibilização de bibliotecas acessíveis às crianças e suas famílias.

Países como Espanha e Estados Unidos desenvolveram programas de distribuição de livros, de orientação aos pais, como incentivo às práticas de leitura e escrita, possibilitando um desempenho melhor destas crianças, num processo de alfabetização futuro.

Uma dica aos pais é que estimulem as crianças à uma experiência cotidiana de leitura, promovendo acesso a livros coloridos e histórias contadas de forma que incentivem a criatividade e a imaginação.

Como a interrupção no ensino e, posteriormente, a mudança no modelo de Educação, ambas circunstâncias causadas pela pandemia, podem impactar no ensino das crianças?

O contexto da pandemia tende a acentuar não somente as desigualdades econômicas e sociais, mas também as desigualdades educacionais. É preciso considerar que a questão não é somente a oferta de aulas não presenciais, mas o acesso dos estudantes aos meios tecnológicos.

Neste momento que é o ingresso no ensino fundamental, as crianças vivem quase que um rito de passagem, são contagiadas pela magia e as experiências da escrita.

Quais as faixas de ensino que são mais prejudicadas por essas mudanças que a pandemia trouxe?

Em relação às etapas de ensino mais prejudicadas, poderíamos destacar o 1º ano do ensino fundamental e o 3º ano do ensino médio, as duas pontas. Nestas etapas, o acompanhamento docente faz-se amplamente necessário para que os estudantes aprendam e se desenvolvam.

No caso do ensino médio, o maior risco e preocupação que este contexto apresenta é em relação à evasão e fracasso escolar. Com a falta de acesso aos meios tecnológicos, pouco acompanhamento familiar e dificuldade em acessar a escola as crianças são impulsionadas a um processo de exclusão escolar.

Qual a importância da escola e do professor no processo de aprendizagem de uma criança?

A educação mediada por tecnologias é um desafio para todas as etapas da Educação Básica, mas na alfabetização esse processo tende a se intensificar, considerando que as crianças nesta fase de escolaridade ainda precisam avançar na construção de sua autonomia. A interação com outros estudantes, com o professor e o contato destas crianças com um ambiente alfabetizador, com jogos e materiais manipulativos, rico em situações desafiadoras pode significar possibilidades importantíssimas na progressão da aprendizagem.

A concepção que ainda hoje prevalece em muitas escolas é a de que o processo de ensino ou aprendizagem é um processo unilateral, ou seja, do professor para o aluno e de assimilação de uma carga de conteúdo. Essa é uma concepção que do meu ponto de vista é completamente ultrapassado.

Como demonstrou Jean Piaget, no século passado: a aprendizagem é um processo ativo. A criança é ativa na forma de tentar compreender o mundo. Então, a melhor versão não é aquela que você põe uma criança sentada, passiva, recebendo informação. A melhor situação de aprendizagem é aquela onde há um processo de interação desse conhecimento. Ou seja, quando um questiona e o outro responde. “Vamos escrever um texto juntos. Será que aqui não está repetindo muitas vezes a mesma palavra? O que podemos usar no lugar dela? Precisa de título, ou não? O que é o título? O que fazer com as palavras que não se conhece? Como se procura no dicionário? ”

Os professores foram treinados em suas respectivas áreas de conhecimento e mostram à criança a pluralidade, a diversidade, as diferentes personalidades e formas de trabalho. A Educação é muito mais do que a aquisição de conhecimento, mas a formação de valores, critérios de conduta, é o respeito ao outro, é lidar com a diversidade. A escola é o meio e o professor, o facilitador deste processo.

Fundação Abrinq em prol da Educação

A Fundação Abrinq, por meio dos seus programas voltados à Educação, fortalece a prática de educadores, por meio de formações, assessoramento técnico, doações de brinquedos e acervos literários, entre outras ações. Atualmente, duas iniciativas se destacam nesta temática:

Projeto Construindo Futuros estimula o desenvolvimento de projetos de vida dos adolescentes, entre 14 e 15 anos, que frequentam o ensino fundamental II.

Programa Creche para Todas as Crianças é uma iniciativa de articulação, sensibilização e mobilização da sociedade para aumentar o acesso e assessorar a melhoria da qualidade do atendimento em unidades de Educação Infantil, tendo em vista o desenvolvimento das crianças.

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