Tese de Livre-docência: A escola e as condições de produção textual: conteúdos, formas e relações
Tese apresentada ao Concurso de Livre-Docência junto ao Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Motivada pela convicção de que é preciso construir uma escola inclusiva, ajustada ao perfil de nossos alunos e aos apelos da sociedade democrática e tecnológica, a presente investigação pautou-se pelo objetivo de repensar conteúdos, formas e relações na escola, mais especificamente, pelo recorte do ensino da língua escrita. Para tanto, o apoio no referencial teórico socioconstrutivista e nas concepções linguísticas de Bakhtin subsidiaram a pesquisa de campo realizada em uma ONG, o Instituto André Franco Vive em São Paulo (SP), com alunos do Ensino Fundamental de escolas públicas, em três frentes de investigação. Na primeira, partindo do problema social do analfabetismo e baixo letramento no Brasil, o tema da escola e da própria língua escrita foram tomados como conteúdos de abordagem junto às crianças, na tentativa de compreender o vínculo deles com a escola e sua relação com a escrita. Na segunda, partindo do problema didático de contemplar a natureza social e dialógica da língua, buscou-se compreender como as diferentes formas de trabalho (propósitos e suportes da escrita no papel ou no computador) afetam a produção textual. Finalmente, a terceira frente de investigação, considerando o problema de posturas educacionais que, tão frequentemente, condenam o aluno à passividade e à submissão, voltou-se para o estudo dos processos interativos (entre alunos e entre eles e o adulto) na construção da escrita e para a resolução de problemas como mecanismo de reflexão. O foco nas relações entre as pessoas e o objeto do conhecimento aponta para uma nova configuração do processo educativo, não só porque valoriza o protagonismo do sujeito aprendiz, como também porque reconhece a complexidade e a amplitude do ideal de formação humana. No estudo de caso, realizado com 30 estudantes (10 do 1º ano, 10 do 3º ano e 10 do 5º ano do Ensino Fundamental), as 214 produções textuais, colhidas em cinco situações e marcadas por diferentes condições de trabalho, constituem o corpus de investigação. Além disso, a gravação em vídeo desses momentos e os registros feitos no Diário de Campo permitiram uma análise dos processos de produção da escrita. O resultado da investigação mostra que as mesmas crianças que foram prejudicadas pelo contexto social de baixo letramento – crianças que têm um frágil vínculo com a escola e uma relação comprometida com o conhecimento – são capazes de reagir aos apelos da escrita e às condições de produção textual.